O que é relacionamento abusivo e como identificar?

relacionamento abusivo entre casal

O que é relacionamento abusivo e como identificar?

Descrito como um ciclo vicioso ou até mesmo uma teia que nos enreda, o relacionamento abusivo não se resume à violência física. Na verdade, esse tipo de relacionamento surge como qualquer outro e pode ter traços imperceptíveis para a vítima.

Recentemente, o Brasil teve a oportunidade de visualizar em primeira mão as manifestações iniciais de uma relação tóxica ao acompanhar em rede nacional o envolvimento da atriz Bruna Griphao com o modelo Gabriel Tavares no reality show Big Brother Brasil 23.

Dividindo opiniões, o caso tornou ainda mais oportuno o debate sobre as relações abusivas e como elas surgem e se desenvolvem. Na ocasião, a atriz teria dito para Gabriel que ela era “o homem da relação”, ao que o modelo respondeu “mas já, já vai levar umas cotoveladas na boca”, no que se tentou justificar como sendo uma brincadeira.

Além dessa, em outras ocasiões Gabriel é flagrado segurando os ombros de Bruna com agressividade, interrompendo sua fala e até mesmo fazendo comentários sobre sua aparência, tudo sempre em tom de brincadeira.

Até que fosse feita uma intervenção pelo apresentador do programa, que alertou o casal sobre o caráter abusivo da relação que surgia entre eles, para ambos, os constantes conflitos tratavam-se apenas de brincadeiras.

É nesse tom de brincadeira e suposta troca de afeto que habitam os comportamentos tóxicos que tendem, quase sempre, a se escalarem para casos de agressão física e sexual.

E em se tratando de um comportamento que pode se manifestar de forma muito sutil, saber como identificar um relacionamento abusivo é uma forma de prevenir seu bem estar e sua segurança na hora de trocar vivências com outras pessoas.

O que é relacionamento abusivo?

O relacionamento abusivo ou relacionamento tóxico é uma relação que apresenta abusos de ordem psicológica, verbal, sexual, emocional e/ou física. Nessa dinâmica, a pessoa que abusa está sempre pronta para se valer de recursos de manipulação para que a pessoa abusada permaneça nesse lugar, com medo de sair.

Esse tipo de relação costuma se comportar como um ciclo de repetição.

O ciclo do relacionamento abusivo
Os conflitos de um relacionamento tóxico caem nesse ciclo repetidas vezes, fazendo com que as pessoas que estão ao redor do casal não entendam porque eles continuam juntos.

A verdade é que é justamente esse ciclo que reforça para a vítima a ideia de que as coisas irão melhorar ou até mesmo incentiva a normalização do abuso.

1. Fase de construção de tensão: aqui a violência psicológica se faz presente de muitas formas, fragilizando a vítima através de crises de ciúme, violência verbal, xingamentos etc.

2. Fase de violência: nessa fase, a pessoa que abusa explode e parte para a agressão física, verbal ou psicológica, causando grande atrito entre o casal.

3. Fase da lua de mel: depois do abuso, vem a necessidade de manter a vítima refém e consertar o estrago com repetidas investidas em objetos, gestos e falas para reconquistar a confiança da pessoa abusada.

O ciclo se repete e se torna cada vez mais intenso, ao passo que a vítima está cada vez mais frágil e a pessoa que abusa cada vez mais confiante.

Como identificar uma relação abusiva? 5 Sinais para observar

Alguns sinais podem ser observados desde o início da relação, embora a fase de lua de mel seja ainda mais intensa no começo da relação devido ao fato de o tempo de convivência influenciar esse fator.

Entretanto, alguns sinais são gritantes e devem ser muito bem observados pela vítima e pelas pessoas que compõem sua rede de apoio.

1- Surpresas para silenciar conflitos
É normal vivenciarmos expressões e gestos de amor exagerados em diferentes momentos da relação. No entanto, quando esse tipo de gesto, como surpresas, presentes e promessas, acontece pouco tempo após um conflito, é um sinal de alerta.

Isso mostra que aquela demonstração de afeto não é genuína, mas sim um mecanismo que fortalece o ciclo do abuso, fazendo com que um momento “positivo” se sobreponha a todos os momentos ruins.

2 – Comentários e gestos inapropriados
Existem brincadeiras que não têm lugar, hora e nem justificativa para serem feitas. Certas coisas não devem ser motivo de brincadeira e é fundamental que a gente ame a nós mesmos a ponto de escolher nos relacionarmos com pessoas que têm consciência disso também.

Tecer comentários ridicularizando a opinião da vítima, fazer pouco caso de suas conquistas, afastar ou rejeitar amigos e familiares e zombar da aparência física são algumas das formas de colocar a pessoa abusada em um lugar de fragilidade constantemente, diminuindo sua autoestima.

3 – Exigência de mudanças de comportamento e personalidade
O terceiro sinal de alerta para relacionamentos abusivos é quando a pessoa que abusa demanda da vítima mudanças de personalidade e comportamento, desde o uso de peças de roupa específicas até o controle do que a pessoa come, como gasta o próprio dinheiro etc.

Note que, aqui, não podemos confundir esse comportamento com os casos de críticas construtivas que são fruto de diálogos saudáveis para elaborar um ambiente de convivência mais harmonioso do casal.

A diferença é que no relacionamento tóxico, esse tipo de exigência surge de forma maldosa, punitiva e sempre muito manipuladora. A pessoa abusadora se vale desses recursos psicológicos para que a vítima se sinta na obrigação de ser alguém melhor ou diferente, caso contrário, ficará sozinha.

4 – Crises de ciúme
Um sinal mais óbvio e fácil de identificar são as crises recorrentes de ciúme, geralmente causadas por razões bobas e infundadas, apontando o lugar imenso de insegurança a partir do qual a pessoa que abusa constrói um sistema de violência sobre a vítima.

Vivenciar brigas e conflitos constantes por ciúme é um sinal de alerta nas relações e não deve ser um comportamento normalizado.

5 – Agressão verbal e violência psicológica
Para sustentar o fato de demandar tanto da vítima, quando não está abusando, a pessoa que abusa simplesmente age como o ser mais apaixonado e devoto do planeta.

Como consequência disso, quando a humilhação ocorre, a vítima pode até mesmo se culpar justamente por essa violência partir de alguém com tanta importância e carinho.
A violência psicológica não parte só de xingamentos, mas também de situações como:

  • Falas que causam insegurança;
  • Constantes pedidos de desculpas e promessas de mudança;
  • Ridicularização das suas opiniões, falas e gostos;
  • Falas que afirmam que a vítima não é digna de receber amor;
  • Diminuir conquistar;
  • Diminuir manifestações de frustração da vítima.

O que a lei diz sobre relacionamento abusivo?

É importante frisar que todos os relacionamentos são passíveis de desentendimentos e conflitos, porém, é preciso que seja de público conhecimento o discernimento do que é um simples desentendimento e o que ultrapassa os limites. Nesses casos, a relação tóxica se torna suscetível à tutela jurídica.

Os relacionamentos abusivos são englobados pela Lei Maria da Penha, de 2006, a qual visa coibir e impedir a violência doméstica. A Lei 11.340/06 destaca no quinto Artigo a sua abrangência:

Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

Dito isso, a Lei considera que existem 5 tipos de abuso: abuso emocional ou psicológico; abuso físico; abuso sexual; abuso financeiro; abuso patrimonial e abuso tecnológico. E dentre os cinco, 4 são previstos pela Lei Maria da Penha.

Casos de violência sexual e estupro
Os casos de violência sexual não se reduzem somente ao estupro. Eles incluem também quando a vítima se sente forçada a fazer algo contra a sua vontade, através de chantagens, ameaças, mentiras, uso da força física ou manipulações.

Além disso, a violência sexual também engloba casos em que a vítima é forçada a não usar métodos contraceptivos.

Para esses casos, O Artigo 7º, inciso III, da lei 11.340/06 tipifica:

III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

Diversos são os países que lutam contra a violência sexual e um exemplo recente foi o caso na Espanha do jogador Daniel Alves, que estuprou a vítima Brooke Shields e acabou preso no país.

Abuso na terceira idade

Não é incomum vermos casos de abuso e maus tratos na terceira idade. Nesses casos, estamos falando de violência contra o idoso, que é um crime previsto por outra Lei e se caracteriza de forma um pouco diferente dos abusos na juventude.

Trata-se da Lei 10.741/2003, no entanto, mulheres que sofrerem abuso na terceira idade ainda estão passíveis de recorrerem à Lei Maria da Penha.

Muitas pessoas confiam seus entes queridos a casas de repouso para poder afastar as vítimas dos abusadores, que em geral costumam fazer parte de seu ciclo de confiança.

Apoio e abordagem psicológica para casos de abuso

As vítimas de relacionamentos abusivos são verdadeiras sobreviventes. A situação degradante coloca em cheque toda a autoestima, confiança e estabilidade psicológica da pessoa abusada.

Nesse cenário, é muito fundamental que a vítima procure apoio psicológico, garantindo o uso da melhor abordagem para tratar o trauma que experienciou.

Também não é incomum que a pessoa agredida precise recorrer aos medicamentos para fazer um tratamento específico para patologias que possam ter sido desencadeadas pelo trauma, com o apoio de um médico psiquiatra.

A influência e visibilidade da internet

Hoje em dia, ficamos sabendo de muito mais casos de abuso do que antigamente. Com o poder da comunicação digital, a rapidez com que as informações viralizam e o forte senso de justiça social que permeia as redes sociais, um caso de abuso pode se tornar o assunto mais comentado do dia para a noite, assim como pode ser esquecido do dia para a noite.

A influência da internet nos casos de relacionamentos tóxicos e abusivos pode ser negativa ou positiva. Por um lado, os recursos tecnológicos que temos atualmente facilitam muito o registro de conversas e situações que servem de evidência em um processo judicial.

Por outro lado, a repercussão midiática pode ser um fator de muita influência negativa na recuperação da vítima, que se torna alvo do olhar público e, muitas vezes, sofre críticas e é culpabilizada.

Preste atenção aos sinais

Lembre-se de garantir que todos os sinais estão “verdes” ao começar uma nova relação ou mesmo ao analisar a relação que você está vivenciando agora. Nunca é tarde para iniciar o processo de desprendimento da vítima com essa relação tóxica.